LETRAMENTO VISUAL: UMA ANÁLISE IMAGÉTICA NO LIVRO DIDÁTICO DE LÍNGUA PORTUGUESA

 

            De modo a investigar a abordagem do letramento visual proposto pelo livro didático (LD), a atividade destacada está inserida no LD do 8° ano da Educação Fundamental das séries finais, dos autores William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães, trata-se do gênero textual Cartum, de Quino, a seção do capítulo que aborda este gênero tem como título “De olho na Imagem”. Diante disso, nosso objetivo é observar como o livro didático propõe o letramento visual a partir das atividades voltadas para o ensino-aprendizagem do letramento visual. Para tanto, observemos a seguinte imagem:

  

Figura 1: Seção do livro didático: “De olho na imagem”, Cartum, de Quino.



Fonte: CEREJA, William Roberto. MAGALHÃES, Thereza Cochar. Português: linguagens, 8° ano. 8 ed. São Paulo: Atual, 2014.   

 

            Em uma breve descrição podemos observar através desta imagem a ocorrência de três cenas distintas, na qual a primeira, está representada por estátuas que significam os termos justiça e liberdade, também temos a presença de três jardineiros caminhando de forma síncrona nas duas primeiras cenas. Na segunda cena, temos a presença da figura materna, um cupido e o pensador, bem como, os três jardineiros que continuam a caminhar, já ao fundo, a imagem das árvores continuam secas, porém, mudam de formato da primeira para a segunda cena. 

          Na terceira cena, o ambiente transforma-se mediante a organização e limpeza do espaço, além disso, percebe-se que há a presença de outros personagens no qual cada um desempenha uma atividade ao ar livre, assim, temos dois personagens realizando uma leitura, enquanto os três jardineiros estão trabalhando na preservação do local, e uma criança contribuindo com a limpeza ao jogar o lixo na lixeira.  Na seguinte atividade abaixo, temos uma proposta didática a fim de produzir uma análise visual da primeira imagem descrita. Vejamos:



 Figura 2: atividade de interpretação da leitura visual.



  

Fonte: CEREJA, William Roberto. MAGALHÃES, Thereza Cochar. Português: linguagens, 8° ano. 8 ed. São Paulo: Atual, 2014.   

 

     Mediante a atividade de compreensão visual disposta no livro didático, observamos que os questionamentos evidenciam o que está exposto na imagem, ou seja, de modo sucinto, estimulam os alunos responderem sobre aspectos explícitos como: quem são as personagens? O que elas fazem? Qual a diferença entre as três cenas? Quais os valores apresentados? Etc. De acordo com essas perguntas, observamos o modo como o livro didático aborda o ensino da imagem, sendo este, direcionado de forma explícita sem apresentar critérios de abordagem crítica. 

            Para Oliveira (2006) no que se refere à leitura crítica de imagens, é necessário que a escola propicie abordagens de ensino que a torne adequada encarando o imagético também como uma materialidade textual, de tal modo, como trabalham no processo de alfabetização e de interpretação textual. Assim, aprender a ler imagens e todos os elementos que a compõe, requer metodologicamente, despertar a criticidade dos alunos através da utilização de critérios de análise, pois: 


Tal qual um caleidoscópio, o qual, ao ser girado, produz diferentes configurações dos mesmos elementos, também o texto visual fornece a possibilidade de diferentes visões de mundo, cujas percepções dependem em grande parte do contexto cultural em que os espectadores estejam inseridos (OLIVEIRA, 2006, p. 22-23).

 

          De acordo com a autora, a leitura visual possui suas diversas composições discursivas, tal qual o verbal, para além disso, as imagens podem representar diversas semioses que complementam os sentidos do texto visual. Em vista disso, assim como o texto possibilita um posicionamento crítico dos sujeitos mediante o ato de ler, na leitura visual não é diferente, ao analisar imagens cada leitor pode apresentar percepções singulares partindo do seu conhecimento sócio-histórico, haja vista que, o texto visual representa um repertório sociocultural, portanto, o produtor e o leitor desenvolvem posicionamentos ideológicos conforme seu conhecimento de mundo e, assim, atribuirá sentidos para à modalidade visual.

         Nesse sentido, na perspectiva de Amaral e Fischer (2013) o letramento visual não deve ser encarado como uma linguagem meramente evidente, dito de outro modo, ao nos depararmos com textos multimodais devemos buscar compreender a partir do todo os elementos implícitos à sua gramática, visto que, a “comunicação visual também possui ‘regras’ linguísticas (ou técnicas) e unidades sintáticas ‘ou elementos’ (2013, p. 11). Nesse viés, não cabe ao professor trabalhar o letramento visual somente por meio de recursos didáticos que sejam veiculados por meio das multimodalidades de ensino, pois, o que interessa para as autoras, diz respeito à realização de uma abordagem crítica mediante uma materialidade visual, de modo que saliente o funcionamento ideológico imagético como um todo construído pelo ponto de vista de cada posicionamento do aluno, assim:


O uso de uma abordagem visual caracterizada apenas como recurso (apresentação de slides e filmes, por exemplo), além de representar uma provável falta de critérios em relação à linguagem visual, pode significar o desperdício desse tipo de comunicação para fins mais significativos (AMARAL & FISCHER, 2013, p.10). 

 

        Em vista disso, as autoras tecem crítica à utilização dos recursos midiáticos quando forem empregados pedagogicamente apenas com o objetivo de inserir as mídias digitais como forma de interação entre mídia e o espaço escolar, sem que os professores reflitam acerca da importância de, através desses recursos midiáticos, desbravar o universo imagético-discursivo da linguagem refletindo o espaço digital como um ambiente no qual os meios semióticos constituem uma co-integração de significados, do ponto de vista da multimodalidade e do letramento. De acordo com Barbosa e Araújo (2014) diante do crescente acesso tecnológico e, consequentemente, a crecente interação social on-line, as pessoas passaram a ter contato de forma constante às multimodalidades semióticas, por isso, a leitura de imagens devem ser ensinadas de forma criteriosa com parâmetros de análise que possa direcionar o aluno em uma leitura visual crítica e, para além disso, ler imagens interpretar e produzir textos imagéticos desenvolvendo, assim, o letramento visual.

            Portanto, conforme a abordagem teórica do letramento visual, as perguntas que foram elencadas no livro didático, não contribuem para um ensino crítico e reflexivo acerca do que está exposto na imagem. Pois, entendemos que indagar sobre pontos de vista que estão evidentes na própria imagem, não propõe uma discussão construtiva e reflexiva aos discentes, ou seja, apontar para o que está explícito ou apenas direcionar para um único sentido produzido na imagem, não é suficiente para um processo de construção de conhecimento reflexivo, visto que, omite os sentidos que foram mobilizados na construção discursiva da imagem. Dessa maneira, de acordo com as autoras que destacamos nesta análise, a teoria do letramento visual é relevante na abordagem do letramento visual a medida em que possibilita identificar por meio de critérios, a produção e o funcionamento discursivo desses textos.

 

REFERÊNCIAS 

AMARAL, Trícia Tâmara do. FISCHER, Adriana. Abordagem da imagem em um livro didático voltado para a alfabetização: perspectivas de letramento visual. Revista Bakhtiniana, p. 5-23, São Paulo, jul/dez, 2013.  

 

BARBOSA, Vânia Soares. ARAÚJO, Antonia Dilamar. Multimodalidade e letramento visual: um estudo piloto de atividades de leitura disponíveis em sites eletrônico. Revista Anpoll, n° 37, p.17-36. Florianópolis, jul/dez, 2014.

 

CEREJA, William Roberto. MAGALHÃES, Thereza Cochar. Português: linguagens, 8° ano. 8 ed. São Paulo: Atual, 2014.   

 

OLIVEIRA, Sara. Texto visual e leitura crítica: o dito, o omitido, o sugerido. Revista Linguagem & Ensino. Vol. 9, No. 1, 2006, (15-39).

 

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