ANÁLISE INTERTEXTUAL DE TRECHOS DOS VÍDEOS O GRANDE DITADOR, DE CHARLES CHAPLIN, ABERTURA DA NOVELA O DONO DO MUNDO, O DONO DO MUNDO ESQUETE DE HUMOR DE OS TRAPALHÕES: A PARTIR DAS TÉCNICAS DE INTERTEXTUALIDADE APRESENTADAS POR CHARLES BAZERMAN

 

1Intertextualidade: estratégias metodológicas

A produção desse material tem como objetivo, a partir das técnicas de intertextualidades desenvolvidas por Bazerman (2021), analisar de que forma essas técnicas de intertextualidade se fazem presentes em vídeos, especificamente, através de imagens. Para esta analise temos como corpus os vídeos: O Grande Ditador, de Charles Chaplin(2005); abertura da novela o Dono do Mundo (1991), de Gilberto Braga; O Dono do Mundo-esquete de humor de os trapalhões(1977). Essa produção está dividida em dois momentos: concepções teóricas e técnicas de intertextualidades, de Charles Bazerman (2021) e em segundo momento, as análises visuais.

Partindo do conceito de Bazerman que aponta a intertextualidade com a percepção de que “nós criamos os nossos textos a partir do oceano de textos anteriores que estão à nossa volta e do oceano de linguagem em que vivemos” (BAZERMAN,2021, p.136) logo, compreende-se que um texto pode constituir-se a partir de uma relação intrínseca com outros textos.

É a partir dessa definição que Bazerman apresenta os modos de manifestação da intertextualidade que pode ocorrer de forma explicita e implícita, em nosso cotidiano, por meio de textos que se apoiam em outros textos e que são replicados intertextualmente para produzir novos sentidos. Diante disso, podemos dizer que o produto final de um texto, de acordo com suas marcas linguísticas, é construído através de reprodução de textos já existentes, e que ecoaram discursivamente por muito tempo na sociedade e posteriormente produziram novos sentidos.

Por conseguinte, surge a importância de compreender as estratégias de construção que permeiam um determinado texto através de critérios metodológicos.  Assim, no âmbito intertextual Bazerman (2021) esclarece que fazer esse tipo de análise “vai ajudar você a distinguir as diversas maneiras como os escritores inserem outros personagens em sua história e como eles posicionam a si mesmos dentro desses mundos de múltiplos textos”, dessa forma, ao observamos uma produção textual devemos buscar identificar por meio dos aspectos levantados, como os  sentidos são materializados, até que ponto determinado texto carrega características pertinentes a uma outra produção distinta, produzindo assim, uma relação entre textos, sobretudo, produzindo efeitos de sentidos.

Bazerman (2021) propôs as seguintes técnicas de representação de análise intertextual com as quais representam as palavras e os enunciados de outros textos, ou seja, por meio das expressões linguísticas pode-se identificar quando e como ocorre a intertextualidade. Começando pela técnica mais explícita, temos a seguinte enumeração proposta pelo autor:

1. Citação direta- A citação direta é normalmente identificada por aspas, pelo adentramento do parágrafo, por caracteres em itálico ou por outro recurso tipográfico destacado das demais palavras do texto;

2. Citação indireta-Essa técnica geralmente especifica a fonte, procurando a partir daí reproduzir o sentido original, usando, contudo, palavras que reflitam a compreensão do autor, a sua interpretação ou a sua perspectiva diante do texto inicial;

3. Menção a uma pessoa, a um documento ou a declarações - A menção a documentos ou a autores depende da familiaridade do leitor com a fonte original e com o que ela diz;

4. Comentário ou avaliação acerca de uma declaração, de um texto ou de outra voz evocada- Geralmente vindos de veículos com renome, obras consideradas canônicas e referências premiadas;

5. Uso de estilos reconhecíveis, de terminologia associada a determinadas pessoas ou grupo de pessoas, ou de documentos específicos- Uso de termos ou frases famosas ditas por pessoas históricas;

6. Uso de linguagem e de formas linguísticas que parecem ecoar certos modos de comunicação, discussões entre outras pessoas e tipos de documento-Os gêneros, os tipos de vocabulário (ou registro), as frases feitas e os padrões de expressão podem ser enquadrados nessa técnica.

            Esses critérios destacados por Bazerman (2021) são técnicas que nortearam as análises intertextuais em nosso corpus investigativo. Assim, ressaltamos que os corpus apresentados tratam-se de textos audiovisuais e iremos descrever a ocorrência de citações diretas ou indiretas através da análise de tais textos.  Dito isso, observemos na próxima seção a construção intertextual nas três materialidades discursivas:

2 Análise visual

Seguindo as técnicas de análise propostas por Bazerman (2021) nesta seção iremos abordar tais aspectos sob a investigação criteriosa entre três textos audiovisuais: O grande ditador, de Charles Chaplin, abertura da novela o Dono do Mundo, O Dono do Mundo-Esquete de Humor de Os Trapalhões.

O vídeo fonte é um trecho do filme “O grande ditador” de 1940, escrito, dirigido e atuado como protagonista Charlie Chaplin, filme esse em que, de forma genial, representa tantos ditadores que tentaram dominar o mundo. Charles Chaplin não foi apenas um grande ator, roteirista diretor e cineasta, mas um gênio da sétima arte e nesse filme tece críticas aos governos de Hitler (Nazismo) e Mussolini (Facismo), o autor faz uma das cenas mais memoráveis do cinema na qual seu personagem ditador “brinca” com o globo terrestre como se o mundo fosse seu “brinquedinho”. Diante do objeto bola, ocorre um processo de consolidação ideológica predominante no discurso da direita, primeiro eles têm uma ideia romantizada sobre o autoritarismo diabólico e quando enxergam que isto não funciona, choram feito crianças.

Nesse processo de interpretação, é preciso identificar que o fenômeno da intertextualidade é de suma importância para analise dos textos posteriormente replicados, como em: Abertura da Novela O Dono do Mundo, O Dono do Mundo-Esquete de Humor de Os Trapalhões, permitindo uma compreensão englobante na medida em que utilizamos os conceitos elaborados por Bazerman (2021) como a citação explícita a uma fonte original, de modo a direcionar o leitor em um processo de intepretação textual através da análise do texto fonte.

Partindo da contribuição teórica do autor, que foi explorado a respeito das técnicas, agora iremos analisar nos vídeos os seguintes elementos semióticos: gestos, postura, ilustrações, cores, luzes, objetos, personagens e símbolos, de modo a observar as técnicas de intertextualidade apresentada por Bazerman (2021), em seguida, elaboramos um quadro síntese a fim de facilitar a visualização intersemiótica entres os três textos, e ao longo das análises iremos descrever os seguintes aspectos em destaque:

 

Ilustração: Quadro analítico das imagens

                                      

Elementos semióticos

O grande ditador

Abertura da novela O Grande mundo

Os trapalhões

 

Citação direta

Citação indireta

 

Gestos

x

x

x

Postura

 

x

 

Ilustrações

x

 

x

Cores

x

 

x

Luzes

x

x

x

Objetos

x

x

x

Personagens

 

x

 

Símbolo

x

x

x

Fonte: Produção própria dos autores. 

Figura (01): o grande ditador, abertura da novela o grande mundo e os trapalhões.



Na primeira imagem, retirada do video original “O grande ditador” de Charles Chaplin reproduzido em 23 de setembro de 2005, podemos observar que a representação de Hitler segurando o globo, faz uma alusão ao desejo de dominação mundial por parte do ditador e, consequentemente, a um contexto histórico vivenciado pelos alemãos no período. Com base no exposto, vale dizer que, um texto é produzido, conforme aponta Bazerman (2021), com base em outros textos ou enunciados já realizados e que fazem sentido porque circularam socialmente em determinado contexto histórico. Para isso, nas análises são utilizadas algumas técnicas citadas por Bazerman (2021) em seu trabalho intitulado “Gênero, agência e escrita” (2021).

Observando a abertura do filme “O Grande Ditador”; bem como da novela “O Dono do Mundo” e  “O Dono do Mundo-Esquete de Humor de Os Trapalhões”, podemos identificar algumas técnicas elaboradas por Bazerman (2021). Nos vídeos supracitados, de início, observamos uma citação direta. Essa técnica é vista na segunda imagem, na abertura da novela “O Dono do Mundo” da Rede Globo, na qual a mesma personagem representada aparece no vídeo “O grande ditador” de Charles Chaplin. No entanto, o personagem que aparece no vídeo “O Dono do Mundo-Esquete de Humor de Os Trapalhões, é o personagem Didi.  

Outra citação direta que podemos observar é na postura. Em ambos os vídeos, tanto em “o grande didator” como na abertura da novela, os personagens fazem os mesmos gestos ao segurar o globo. Apesar disso, o globo da abertura da novela apresenta  imagens de mulheres que mostram, pelo que se pode perceber, que  a personagem deseja dominar as mulheres para usá-las por simples prazer, ao  invés do mundo propriamente dito, como se ver na imagem do filme “ o grande ditador”, ou seja, ambos os personagens possuem o desejo de dominação, porém, almejam "objetos" diferentes. No que tange a postura, o mesmo não é constatado no video de Os trapalhões, posto que o personagem Didi rouba o lugar do personagem real ao entrar na gravação. Há, portanto, um embate, entre ambos, pelo lugar e pelo poder de dominação.

Contudo, podemos ver uma citação direta no esquetes do programa humoristico “Os trapalhões”. Essa técnica é vista na remissão que o programa faz à abertura da novela. O personagem Didi entra por curiosidade nas gravações da abertura da novela e, com requintes humorísticos, a personagem, que é um típico mulherengo e ambicioso, corre atrás do globo e, finamente, o fura intecionalmente para que, assim, possa dominar a mulher que deseja.

A técnica da citação direta entre os vídeos na abertura da novela e os trapalhões é perceptível também  na cor  para dá destaque a figura da mulher e, portanto, mostrar as reais intenções dos personagens nos dois vídeos. Desse modo, percebemos que a intertextualidade na produção dos vídeos também corroboram para manifestação de efeitos de sentidos no texto. Diante disso, na figura 2 iremos descrever outros dois elementos intersemióticos: o símbolo e a luz presente nas três imagens:     

Figura (02): o grande ditador, abertura da novela o grande mundo e os trabalhões.


  À luz das técnicas de representação intertextual de Bazerman (2004) podemos identificar nos trechos dos vídeos base, vídeo 1 (abertura da novela – O dono do Mundo) e vídeo 2 (Os Trapalhões) a segunda técnica de representação intertextual, a de citação direta ,a partir da referência imagética na cena de fundo histórico que resume a menção explícita utilizada por meio do símbolo da dupla cruz, que faz referência clara à atitudes nazistas e que são usadas nos outros dois contextos com a mesma representação visual, porém com maior destaque  na abertura da novela, na qual de forma humorística é representada na cena dos Trapalhões.     

Apoiado em Bazerman (2021) o significado é construído no momento em que o leitor tem trocas com o texto, o próprio texto não contém nenhum significado se não houver intercambio/conexão (Rosenblatt,2004), desse modo, para que o leitor alcance uma compreensão completa do esquete de humor em Os trapalões, é preciso que o leitor tenha um conhecimento histórico e cultural acerca da representação dos símbolos que são expostos nos vídeos.

Nesse sentido, mediante ao que está exposto na figura dois, temos a representação do símbolo da suástica com o formato de uma cruz representativo de muitas culturas e religiões em tempos diferentes. Porém, atualmente esse símbolo é retomado em outro contexto histórico e passa a ser reconhecido mundialmente por representar a ideologia nazista. Dessa forma, partindo do texto fonte “o grande ditador” esse símbolo é marcado ideologicamente pela cultura nazista que tem o Adolf Hitler como o grande líder dessa doutrina.

Contudo, de modo a repetir-se na cena de abertura da novela “o dono do mundo”, nesta ocasião, o símbolo nazista passa a denotar novos sentidos, pois, enquanto Adolf Hitler é um líder que utiliza do seu lugar social político para persuadir o povo a acreditar nas atrocidades que ele defende, por outro lado, no âmbito da novela, este símbolo possibilita a ideia de poder da figura masculina em detrimento das mulheres, visto que, o enredo da novela é constituído pelas ações machistas do protagonista Felipe Barreto, contra a protagonista Márcia, pois, Felipe a seduz até conseguir tirar a sua virgindade para satisfazer-se momentaneamente, além disso, Felipe faz isso com todas as mulheres com as quais se envolve na trama.

Portanto, de acordo com as técnicas de análise propostas por Bazerman (2021) os símbolos representam a força ideológica masculina por meio de uma citação direta, esse tipo de citação “ é normalmente identificada por aspas, pelo adentramento do parágrafo, por caracteres em itálico ou por outro recurso tipográfico destacado das demais palavras do texto” (BAZERMAN,2021) no caso da imagem em questão, a referência original do texto é representada pelo símbolo nazista, bem como, pela luz presente nas três imagens, configurando desse modo, o fenômeno da intertextualidade por meio dos recursos semióticos em comum. Para além disso, vale ressaltar que na imagem em que aparece a cena de um “Esquete de humor em os Trapalhões”, por tratar-se de um gênero humorístico, mobiliza uma crítica ao posicionamento ideológico de ambas as personagens anteriores, Adolf Hitler e o Dono do Mundo de forma sarcástica.

Para concluir

Dessa maneira, a análise realizada considera muito importante as técnicas elaboradas por Bazerman (2021) pelo viés da intertextualidade, visto que, um texto pode apresentar correlações contextuais através de textos audiovisuais como vimos e com outros textos que foram produzidos ao longo da história tratando, assim, de temáticas atuais que podem negar ou reafirmar um discurso já existente.

No entanto, no campo humorístico, os sentidos produzidos reverberam uma crítica social, pois, o humor nos faz refletir criticamente acerca de temáticas complexas e polêmicas do cotidiano de modo a “suavizar” problemáticas sociais, como, por exemplo, os discursos nazistas, fascistas e machistas, como pudemos observar ao longo das produções audiovisuais retratadas neste trabalho.   

 

REFERÊNCIAS:

Bazerman, Charles. Intertextualidade: como os textos se apoiam em outros textos In. Gênero, agência e escrita / Charles Bazerman; Angela Paiva Dionisio (Organizadora), Judith Chambliss Hoffnagel (Organizadora e Tradutora) – 2. ed. – Recife: Pipa Comunicação, Campina Grande: EDUFCG, 2021.

 

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